DIREITOS HUMANOS E A DEFESA DOS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA ♿
CAOPIPD - Área da Pessoa com Deficiência
Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça de
Defesa dos Direitos de Pessoas Portadoras de Deficiência
Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça de
Defesa dos Direitos de Pessoas Portadoras de Deficiência
DIREITOS HUMANOS E A DEFESA DOS DIREITOS DAS PESSOAS COM
DEFICIÊNCIA
DIREITOS HUMANOS ENCONTRO BRASILEIRO UMA PÓS-GRADUAÇÃO EM
REALIDADE Evento fruto de promoção conjunta do CONSELHO FEDERAL DA OAB
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS ADVOGADOS CRIMINALISTAS ASSOCIAÇÃO PARANAENSE DO
MINISTÉRIO PÚBLICO OAB/CURITIBA ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS DO BRASIL PALESTRA
SOBRE:
"DIREITOS HUMANOS E A DEFESA DOS DIREITOS DAS PESSOAS
COM DEFICIÊNCIA"
Como é de conhecimento de todos, volta-se o presente
"Encontro" à "Discussão sobre o verdadeiro significado de
direitos humanos com vista ao mapeamento do grau de respeito ao ser humano no
Brasil para direcionamento das políticas públicas." No que tange aos
direitos humanos ligados, especificamente, às pessoas com deficiência, oportuno
urge o destaque quanto à inteira propriedade do momento em que se realiza este
tão importante acontecimento científico e cultural, na medida em que este ano
de 2006 é dedicado à inclusão social das pessoas com deficiência e com
mobilidade reduzida e às ações fraternas em prol dos direitos protetivos do
segmento em tela; em que a igreja empunha a bandeira da "Campanha da
Fraternidade", cujo lema é "Levanta-te e vem para o Meio", a
significar um chamamento à inserção social dirigido à todas as classes de
pessoas, sem qualquer distinção. Por conseqüência, este é o ano que deve
voltar-se à efetivação das medidas destinadas à concretização dessa nobre
causa, notadamente no que concerne à eliminação de barreiras físicas e sociais
de toda natureza. O momento, assim, é de todo propício à mais ampla discussão e
reflexão sobre os direitos afetos a essa população. Levando-se em estima o
escopo primordial deste grandioso evento e, em especial, o assunto referente
aos "Direitos humanos e a defesa dos direitos das pessoas com
deficiência", sobreleva-se, não só em razão da grande importância do
assunto, mas, também, à relevância do interesse público e social que o cerca, a
utilização deste espaço para trazer à baila algumas reflexões a respeito do
tema que trata da
"Integração Social Das Pessoas Com Deficiência",
que vem a significar, em sentido amplo, a igualdade de oportunidade para todas
as pessoas com deficiência, afastadas as discriminações e os preconceitos de
qualquer espécie, com vista ao asseguramento do pleno exercício, por essa
população, de seus direitos humanos, sociais, e liberdades fundamentais e,
conseqüentemente, da garantia de inserção irrestrita no convívio no seio
da sociedade. É dizer: direito ao acesso, à fruição e à
participação, de forma completa e
igual com independência e autonomia, total ou assistida - do
mercado de trabalho, da educação, saúde, moradia, cultura, esporte, lazer, segurança,
previdência social, dos sistemas e meios de comunicação e informação, dos
serviços de transporte coletivo, dos serviços e atendimentos públicos e
privados regularmente postos à disposição da sociedade (tais como operações e
atendimentos bancários, hospitalares dente outros), bem como o acesso a locais
públicos e/ou de acesso ao público em geral, ainda que de propriedade privada
(tais como cinemas, clubes, estabelecimentos comerciais, teatros, shoppings
centers, instituições bancárias, espaços de lazer e recreação infantis e
adultos, instituições religiosas, instituições de ensino, de saúde,
bibliotecas, espaços destinados a eventos artísticos, esportivos e culturais e
outros congêneres). Não se pode olvidar que as pessoas embora possam apresentar
diferenças de diversas naturezas, são, contudo, iguais em dignidade e direitos.
É o que preceitua o "Artigo I da Declaração Universaldos Direitos Humanos
", segundo o qual: "Todas as pessoas nascem livres e iguais em
dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em
relação umas às outras com espírito de fraternidade."
Consagra-se, assim, no documento em referência, o direito a
igualitárias oportunidades de participação social que deve ser destinado a
todas as pessoas, indistintamente, sem exclusão, por conseguinte, daquelas com
deficiência. Cabe ainda frisar que o direito de integração social, assim como o
de tratamento isonômico às pessoas com deficiência, acham-se diretamente
interligadas aos de habilitação e de reabilitação que também lhes assistem,
estando todos no mesmo patamar, a considerar que o tema tratado refere-se aos
princípios basilares da proteção legal especial dos direitos e garantias afetos
a esse segmento, e a meta que se pretende atingir é o nivelamento completo e sempre
evolutivo dessa população no processo de sua inclusão no contexto social, com
vista ao asseguramento das condições do pleno exercício dos direitos afetos à
cidadania. Consectário disso é a importância do reconhecimento, por parte da
sociedade e do Estado, acerca do direito que têm as pessoas com deficiência, de
que as suas condições e necessidades especiais sejam levadas em consideração em
todos os estágios de planejamento sócio-econômico, influenciando, fática e
eficazmente, a promoção, a formulação e a avaliação de todas as ações,
políticas, planos e programas de desenvolvimento social, nos âmbitos nacional,
regional e internacional, até porque, segundo dados extraídos do último censo
de 2000, realizado pelo IBGE, aproximadamente 24,6 milhões de brasileiros, ou
14,5% da população total do país, apresenta algum tipo de incapacidade ou
deficiência.
De outro vértice, não obstante a existência do princípio
constitucional da isonomia, consagrado no caput do artigo 5º, da Constituição
Federal de 1988, segundo o qual "todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza"; das recentes conquistas legislativas
sobre a matéria (cabendo especial alusão à Lei nº 7.853/1989, que dispõe sobre
a Política Nacional para a Integração Social da Pessoa Portadora de Deficiência
regulamentada pelo Decreto Federal 3298/99 Leis Federais 10.048, de 08.11.2000,
que dá prioridade de atendimento às pessoas com deficiência e a 10.098, de
19.12.2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da
acessibilidade das pessoas com deficiência, ambas regulamentadas pelo Decreto
Federal nº 5.296, de 02.12.2004) bem como dos ideais e objetivos traçados na
Declaração Universal dos Direitos Humanos, na Declaração dos Direitos das
Pessoas Deficientes, na Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as
Formas de Discriminação Contra as Pessoas Portadoras de Deficiência (promulgada
pelo Decreto Federal nº 3.956, de 08.10.2001) e, ainda, apesar de todos os
esforços e ações até então encetados pela sociedade e pelo poder público, e do
discurso proclamado a todos os ventos acerca de toda uma "ideologia
voltada à Inclusão", certo é que as pessoas com deficiência, ainda nos
dias atuais, continuam a enfrentar sérios obstáculos e desafios para a sua plena
participação como membros iguais da sociedade, sendo incontestável que
injustiças e exclusões ainda fazem parte do nosso cenário social.
Por óbvio, não se pode conceber, principalmente no momento
histórico ora vivenciado - em que se professa o repúdio a qualquer forma de
discriminação e de preconceito - que a mesma sociedade à qual compete o dever
legal e constitucional de inserir em seu meio todas as pessoas,
indistintamente, venha a apresentar qualquer espécie de obstáculo à
implementação dos direitos e interesses da pessoa com deficiência ou de
insistir em uma realidade social que seja avessa à concretização dessa nobre
causa, de modo a despertar no íntimo dessa população um sentimento de
desagregação, quando, ao revés disso, à vista do propósito de inclusão social,
o mister maior do indivíduo, da sociedade civil organizada e do Estado, é o de
adotar ações positivas, que despertem nessas pessoas o senso de pertencimento
ao mundo de que fazem parte. Noutros falares: é inaceitável que a realidade
social venha a representar fator de desintegração social da pessoa com
deficiência, o que fatalmente ocorrerá se não se levar à prática, de logo, por
meio de providências concretas, os direitos dessa população (já estabelecidos
em legislações próprias), ou se não houver a igualdade de ascensão e de
oportunidades para todos, nos exatos lindes do princípio constitucional da
isonomia e das diretrizes contidas nas regras padrões sobre a igualdade de
oportunidades para o segmento em tela. Mas todas essas constatações são importantes
na medida em que abrem um espaço para um avaliação crítica de nosso panorama
social, bem como de luta para se buscar a igualdade de oportunidades para os
cidadãos portadores de deficiência, de forma a garantir-lhes a genuína
integração social.
Descortina-se, destarte, "um tempo de mudanças", a
erigir-se em terreno fértil para a revisão de posturas e de reorganização
sócio-cultural, máxime quando a necessidade de concretização dos direitos das
pessoas com deficiência, reclama o incontinenti redesenho de nossa história.
Desse modo, examinando a questão em face dessa perspectiva da inclusão social,
impera a conclusão de que somente diante de efetivas ações que visem o pronto
cumprimento das disposições legais e constitucionais que lhes concernem, é que
será possível assegurar às pessoas com deficiência o pleno exercício de seus
direitos básicos e de todos os demais que, decorrentes das leis e da
constituição, se prestem a propiciar-lhes o bem-estar social e econômico.
Para tal finalidade, urge inadiável que o Poder Público e a
Sociedade empreendam medidas que tenham por objetivo dotar todos os setores da
sociedade dos equipamentos, mecanismos, e recursos materiais e humanos que se
afigurarem necessários ao completo acesso dessa população nos espaços públicos
e privados e a todos os atendimentos e serviços postos à disposição da
população. Quanto ao tema, sobreleva-se o especial enfoque nas ações voltadas à
capacitação, treinamento e formação profissional e técnica de recursos humanos
aptos à prestar adequadamente o atendimento e os serviços de atendimento às
pessoas com deficiência física, auditiva, visual, mental e múltipla.
Destaque-se, ainda, que dentre as responsabilidades do
Estado e da sociedade, está a de propiciar a essas pessoas, as denominadas
ajudas técnicas, assim consideradas como os produtos, instrumentos,
equipamentos ou tecnologia adaptados ou especialmente projetados para melhorar
a funcionalidade da pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida,
favorecendo a autonomia pessoal, total ou assistida. Assim, como
exemplificação, espera-se, tanto no âmbito público como no privado, que a
pessoa com deficiência não seja prematuramente privada do direito ao
asseguramento da reserva legal de vagas no mercado de trabalho à justificativa,
por exemplo, de que não possui capacidade plena para o desempenho de
determinada função. Deseja-se, de igual forma - que ao invés de se concluir,
precocemente, que uma pessoa, em razão da deficiência apresentada, não tem
aptidão ou capacidade para o desempenho de uma determinada função,
cerceando-lhe, mediante tal argüição, o direito de nomeação e da entrada em
exercício do cargo ou função - que antes se lhe propicie os meios, recursos,
mecanismos, instrumentos, apoios, ajudas técnicas e adaptações necessários
(tais como os ledores e o sistema Braille para o deficiente visual -
intérpretes em línguas de sinais/LIBRAS para o deficiente auditivo recursos de
informática adaptações arquitetônicas, entre outros), de forma a permitir que
essa pessoa com deficiência, no decorrer do estágio probatório ou do período de
experiência, portanto já nomeada e em exercício, disponha dos recursos
necessários ao bom desempenho de suas funções. Significa dizer: para que ocorra
a plena inclusão social das pessoas com deficiência, primordial urge que antes
de cercear e coibir direitos, sob o pretexto da deficiência, compete
disponibilizar-lhes os meios e recursos que despontarem necessários à promoção
da garantia de acesso e permanência dessa população no âmago da sociedade, em
igualdade de condições com os demais, seja no campo do mercado de trabalho ou
em qualquer outro âmbito, desmantelando-se, assim, de vez, todo o tipo de
barreiras físicas ou sociais, que representem ou possam representar, de alguma
forma, óbice à sua participação como membros iguais dessa sociedade.
Partindo-se, pois, da premissa de que "o estado de direito só atinge o
verdadeiro escopo quanto não se afasta de uma ordem jurídica ancorada na
aclamação dos direitos dos cidadãos e da efetiva garantia e proteção desses
direitos" e da firme convicção de que toda apreciação e interpretação dos
temas e legislações em torno dos direitos das pessoas com deficiência devem
levar em conta a proeminência do caráter social de que se revestem, primando-se
pela busca da manutenção dos fins sociais a que se destinam é às exigências do
bem comum, é que este Ministério Público dedica o seu mister à defesa e tutela
dos direitos e interesses difusos ou coletivos, individuais indisponíveis e
individuais homogêneos da pessoa com deficiência, visando a preservação e a
aplicabilidade dos direitos já alcançados, de maneira que as derradeiras
conquistas legislativas garantidoras dos direitos e interesses desse segmento -
notadamente no que se refere à isonomia de oportunidades e a eliminação de toda
forma de preconceito e de discriminação - exorbitem do campo meramente formal
para representarem, de fato, o verdadeiro sentido da inclusão social. Noutros
falares: no sentido de que a letra da lei não se preste à mera aparência de
proteção legal dos direitos e interesses dessas pessoas, ou como subterfúgio
para encobrir exclusões sociais.
Destaque-se que, a par da busca pelo efetivo cumprimento dos
preceitos legais já assegurados às pessoas com deficiência, labuta também este
Parquet pelo avanço na direção de novas conquistas em prol dos direitos desse
segmento. Quanto ao aspecto, insta registrar que este órgão ministerial, dentre
várias outras medidas e providências que vem desenvolvendo na área em
referência, tem acompanhado periódica e sistematicamente a evolução a respeito
do andamento e dos desdobramentos sobre atuais e importantes temas voltados ao
asseguramento dos direitos humanos e liberdades fundamentais da pessoa com
deficiência, tais como o texto da "Convenção Internacional dos Direitos da
Pessoa Com Deficiência", cujo processo e discussão vêm sendo conduzido
pela Organização das Nações Unidas/ONU e o texto substitutivo ao Projeto de Lei
que institui o "Estatuto da Pessoa Com Deficiência", em relação ao
qual este Ministério Público, através do correlato Centro de Apoio, com vista à
contribuição ao texto do Projeto de lei em destaque, apresentou formais
sugestões e proposições referentes a diversos aspectos afetos aos direitos das
pessoas com deficiência. Desse modo, pautado no propósito da promoção da
justiça social, é que se pretende que o trabalho diário deste Ministério
Público se faça arvorar em uma verdadeira "rampa jurídica" de acesso
aos direitos das pessoas com deficiência, no sentido de que a missão desta
Instituição represente para esse segmento um eficaz instrumento de superação de
barreiras de toda natureza, e, assim, à completa fruição de seus direitos
humanos, sociais e liberdades fundamentais, a conferir-lhe o pleno exercício da
cidadania. Por oportuno, valho-me deste espaço para fazer um veemente apelo ao
Poder Público, ao indivíduo e à sociedade organizada, para que persistam no
empreendimento das necessárias ações que visem ao atendimento dos direitos das
pessoas com deficiência, permitindo o seu fortalecimento social, econômico e
político, como cidadãos plenos que também são, pois só assim será possível
conferir ao tema o "verdadeiro significado dos direitos humanos do
segmento em referência", tal como preconizado nas Leis, Decretos e
normativos vigentes e, em especial, nos exatos moldes da Constituição Federal
de 1988, em cujo Diploma se preconiza que a igualdade é signo fundamental da
República e vem como forma de proteger a cidadania e a dignidade, fundamentos
do Estado Democrático de Direito, eliminando-se as desigualdades sociais, que é
um dos objetivos fundamentais de nossa República Federativa, tendo, ainda, a
prevalência dos direitos humanos, como um dos princípios que devem regê-la nas
suas relações internacionais. Sirvo-me, ainda, deste importante momento, para
dirigir às pessoas com deficiência, um especial apelo: "Não esmoreçam em
relação ao pleito da inclusão social.
Não permitam que as limitações de ordem física, que a falta
ou deficiência dos sentidos ou de funções calem em seus íntimos o grito de luta
pelos seus direitos ou que representem obstáculos à conquista de seus mais
nobres anseios. Porque os objetivos e os horizontes do homem vão para além de
uma cadeira de rodas ou da falta dos sentidos ou das funções, porquanto os
objetivos, os ideais e os horizontes do homem habitam na sua essência, na sua
alma e no seu espírito." Por fim, trilhando sempre a linha de raciocínio
segundo a qual jamais devemos descansar na busca dos nobres ideais, encerro a
minha fala citando o poema extraído do Livro "Luz Infinita", de
autoria da festejada Helena Kolody, que bem traduz o espírito de luta que de
todos nós é esperado: "Para quem viaja ao encontro do sol, é sempre
madrugada".
Curitiba, 01 de agosto de 2006.
Terezinha Resende Carula Promotora de Justiça.